sexta-feira

Bianca Alves



Sua pele estava vestida de adeus, Deus sabe o quanto eu quis ficar, a estrada também soube, num mantra silencioso pedi aos astros, aos deuses mitológicos, aos santos que desconheço, aos orixás, deuses negros, as entidades, erês, pretos velhos, moças com vestidos vermelhos, as orações da infância, recorri a tudo que eu lembrei, não queria te perder... 
Te perder é respirar diferente, sempre fundo e nunca suficiente, o ar escapa, a beleza me escapa, assim eu sufoco, me afogo, foi assim com as lágrimas, elas vieram, inicialmente comportadas,quietinhas e elegantes, depois num grito seco,agudo e quase bonito de tão triste... Só parei quando notei o tamanho da minha solidão no quarto, era madrugada, não tinha ninguém pra me abraçar, pra falar que isso logo passa, que é questão de tempo, que foi melhor pra gente, que Deus sabe das coisas, ele sabe, sabe de mim, sabe das minhas noites, noites tristes onde cato o ar que resta, acendo a luz, olho em volta e tudo me fala do logo mais, essas coisas deviam estar em pequenas e grandes caixas de papelão, eu não estou me despedindo desse quarto, da posição da estante, dos quadros, eu estou me despedindo de você.
E por mais consciente,certa da nossa escolha, eu não estou pronta... me desconheço sem os seus cachos, pintas,corujas, sem o seu colchão duro, vou parar, sinto falta do som da sua chinela pela casa, da bíblia aberta no quarto da sua mãe, do frio quando você pegava o cobertor, do calor quando você me encontrava, meu silêncio não é covardia, estou muda, faltam dois meses para o fim do ano, o ano mais feliz e triste da minha vida de agora, outros virão, outros vilões (a gente), outros vagões, outros roteiros, outros, outras, nunca mais você, nunca mais eu...

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