segunda-feira

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Bianca Alves





Odeio me despedir de novo e de novo, nada novo, somos boas nisso, práticas, quando temos problemas, a solução é ir embora, deixar o amor no lugar de sempre e partir com as roupas do corpo, escrevo ainda dormente, ainda com  raiva, ainda descrente que não foi um até logo, que não tem mês que vem,  passagens compradas e latidos na minha chegada, escrevo pra não gritar, a casa está cheia e me parece covardia sofrer de novo, sei que mais tarde na solidão do quarto, no silêncio da casa eu vou cair no choro e vou  trair minha raiva, meu orgulho, meu despreparo, nunca estamos prontos, nunca aceitamos a morte das coisas, lembrei do meu avô, 104 anos, cansado, senil, com um quadro de demência, me olhava sem me ver, a solução seria a morte, sempre que eu o encontrava eu me despedia, tinha vivido muito e no final, sofria, quando sua morte chegou acreditei que não sofreria, mas sofri, não estamos prontos para o fim das coisas que amamos, não estamos prontos para deixar de ver, para nos despedir dos cheiros, dos sorrisos, não estamos prontos, nos despedir é nos despedir do melhor da gente, espero que depois de tanto adeus, Deus, eu realmente parta, senhor, aparta, essa dor que aos poucos se instala, toda vez que você vai embora eu fico em cacos, pedaços indivisíveis da minha frágil matéria, aos poucos  me ergo, junto o que resta, me visto desse sorriso fácil, cínico, lembrei Cartola “De cada amor tu herdarás só o cinismo”,sigo, desejando que seja a última vez, já que nos cansamos, perdemos a beleza e o amor virou um hábito, algo fisiológico, mecânico, que lembramos só quando dói ou faz frio. Não quero passar a vida te esperando, vivendo amores na superfície pra garantir sua volta, rainha, dona de todas as corujas, dos ventos, dos cantos e de mim. 

Um comentário:

  1. Anônimo26.8.13

    Rainha, dona de todas as corujas, dos ventos, dos cantos e de mim. Que bonito, me emocionou, você é de Bsb?

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""Erótica é a alma""

Adélia Prado