quinta-feira

"Quando os amantes dormem"


Affonso Romano de Sant'Anna


Quando as pessoas se amam e querem se amar,
selam um pacto: dormir juntas.
E quando se fala "dormir juntos"
o sentido é duplo: significa primeiro amar acordado em plena vigília da carne,
mas, depois, na lassidão do pós-gozo, deixar os corpos lado a lado,
à deriva, dormindo, talvez.
Na verdade, os amantes, quando são amantes mesmo,
mesmo enquanto dormem se amam.
Agora ouço esses versos de Aragón contados por Ferat:
"Durante o tempo que você quiser nós dormiremos juntos".
E penso: é um projeto de vida, dormir juntos, continuamente.
A mesma ambigüidade: dormir/amar juntos, dormir/acordar juntos,
ou então, dormir/morrer de amor juntos.
Deve ser por causa disto que os franceses chamam o orgasmo de "pequena morte".
Deve ser por isto que os amantes julgam poder continuar amando mesmo através da morte, como Inês de Castro e D.Pedro, que foram sepultados um diante do outro,
para que no dia do reencontro, um seja o primeiro que o outro veja.
Amor: um projeto de vida, um projeto de morte.
Se numa noite dessas o vento da insônia soprar em suas frestas,
repare no corpo dormindo despojado ao seu lado.
Ver o outro dormir é negócio de muita responsabilidade.
Mais que ver as àguas de um rio represado gerando uma usina de sonhos,
é ver uma semente na noite pedindo um guardião.
Pode ser banal, mas é isto: amar é ser o guardião do sonho alheio.
Os surrealistas dizem

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