sábado

O TRÁGICO FIM DE TODO AMOR


Marta Medeiros

Estou lendo a biografia da psicanalista e mulher-à-frente-do-seu-tempo Lou Salomé, que viveu entre 1861 e 1937, e encontrei no livro a seguinte frase atribuída a ela: “Todo amor está vocacionado para a tragédia. Só que o amor feliz morre de saciedade, e o amor desventurado morre de fome”. Ai, que coisa mais desesperançosa. Mas é preciso admitir que, analisando profundamente as relações amorosas, faz sentido. O amor feliz é o amor que dura por muito tempo, que é retribuído, que é vivenciado diariamente. Até que vai se esgotando, vagarosamente. A longa duração do amor lhe confisca a novidade e a paixão, desperta em nós a dúvida se ainda é amor ou se virou fraternidade. A retribuição do amor também gera desconfiança: será que não se transformou em hábito? Será que não há uma certa condescendência com os meus defeitos, comodismo com a situação? E a convivência diária tampouco conforta, pois começamos a perceber que em vez de estarmos apaixonados por alguém, estamos, isso sim, acostumados com alguém. Pois é. Amor demais satura. Morre de saciedade. Não há mais fome de desejo, mais fome de conquista, mais fome de beijos roubados, mais fome de palpitação. O amor desventurado, por sua vez, tem todas essas fomes, mas ela nunca é apaziguada, seja porque o casal não compartilha das mesmas idéias, ou porque mora em cidades diferentes, ou porque os dois possuem temperamentos explosivos, ou porque são jovens demais, ou implicantes demais, ou enrolados demais. Torna-se um amor infeliz, um amor que não se concretiza, que não se domestica, que termina pelo cansaço da busca por paz. Então é mais ou menos assim: uma vez saciados, queremos um amor esfomeado, um amor carente de sabores novos. E trocando o amor saciado pelo amor esfomeado, passamos a querer estabilidade, querer que este amor torne-se sereno e nos sacie. Que gente maluca são esses tais de seres humanos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

""Erótica é a alma""

Adélia Prado